O que é Filosofia?
A coruja, Ave de Minerva, é o símbolo da Filosofia. O filósofo Hegel escreveu que, assim como a coruja levanta vôo ao anoitecer, também a Filosofia e os grandes filósofos surgem em momentos em que a sociedade humana começa a anoitecer, a entrar em crise...
No seu sentido mais comum, o substantivo filosofia ou o verbo filosofar tem a ver com pensamento ou com o ato de pensar. Filosofar é pensar sobre o que nos acontece, sobre o sentido do que nos acontece ou sobre o significado da vida humana. Alguns dizem que se tem uma “filosofia de vida”. Mas este significado do termo certamente é muito amplo e vago. Há um sentido menos comum, em que filosofar significa saber viver com sabedoria, de acordo com uma doutrina, com uma Filosofia. Assim há, por exemplo, sabedorias diferentes daquelas que conhecemos no mundo ocidental, como as dos sábios orientais Confúcio e Lao Tsé (China), Buda (Índia) e Zaratustra (Pérsia), mas as suas doutrinas ainda estão vinculadas à religião, e não caracterizadas pelo uso da razão, pela racionalidade.
Existe, porém, um sentido mais específico e preciso de filosofar: procurar e/ou encontrar a verdade por meio de uma atividade racional. E a gente encontra a verdade porque precisa e deseja sabê-la. E a verdade é necessária para viver. Mas nem todas as perguntas que fazemos são perguntas filosóficas, como nem todas as respostas são respostas filosóficas. Não é “filosófico” saber: “que dia é hoje?”, mas é filosófico perguntar: “o que é o tempo?” O que é a verdade? O que é a mentira? O que é a liberdade? O que é a razão? São todas perguntas filosóficas. E sabemos que nem todos estão acostumados a fazê-las e tampouco consideram que sejam perguntas importantes.
A ATITUDE FILOSÓFICA
Podemos dizer que filosofar é ter uma “atitude filosófica”. Mesmo que digamos que “de filósofo e louco todo mundo tem um pouco”, de fato são poucos os que têm esta atitude, exigindo-se para isso o conhecimento dos textos da História da Filosofia e, principalmente, a criação do hábito de pensar de maneira rigorosa e crítica.
Falamos, portanto, da Filosofia que quebra com o nosso saber prático do dia a dia, e que nem sempre nos agrada, pois à primeira vista parece ser perda de tempo ou incômodo exagerado com as coisas, deixando-nos, quem sabe, angustiados demais, para além do conveniente.
O filósofo pode parecer alguém desligado da realidade, vivendo nas nuvens, em coisas abstratas, distraído, perdido ou aparentemente alheio aos problemas concretos da vida. Como exemplo desta visão preconceituosa da filosofia, temos a história do antigo sábio grego, chamado Tales, que, ao olhar para o céu a fim de entender os movimentos das estrelas, acabou caindo num poço. Ou com um ditado popular italiano bastante conhecido: “a Filosofia é a ciência com a qual ou sem a qual tudo continua tal e qual!”.
É claro que tudo isso não é verdade. O filósofo, ao contrário de ser uma pessoa distante do mundo, preocupa-se a fundo com suas questões e não se contenta com as coisas óbvias. Ele é inimigo mortal de qualquer fanatismo, de qualquer dogmatismo (crença não explicada). Todo filósofo é um porta-voz consciente de um povo.
Filósofo não inventa a realidade, mas interpreta a realidade em que vive. Assim, podemos afirmar que toda filosofia é e deve ser radical, pois não se contenta em ficar na superfície das coisas, mas procura ir às raízes (por isso, radical), busca desvendar os porquês das coisas.
O filósofo faz perguntas do tipo: o que é a realidade? Como a realidade é? Por que a realidade é assim? Ele procura a essência (aquilo que torna uma coisa aquilo que ela é), o significado e a origem do que quer conhecer.
O filósofo reflete. Falar de reflexão lembra o espelho no qual a gente se reflete. Pois bem: filosofar é refletir. É um movimento de volta sobre si mesmo. Refletir é pensar o próprio pensamento. É esta capacidade humana que nos distingue dos seres animais.
De toda forma, quem prefere uma vida tranquila, uma vida mais grudada ao cotidiano, ao terra-a-terra, fica longe da Filosofia. E quem quer alcançar maior profundidade, quem gosta de chegar às raízes, ser mais radical, vai precisar dela, mesmo que isso não lhe venha a trazer certezas ou tranquilidade.
O filósofo é quem assume correr o risco de viver mais inseguro, ter cada vez mais perguntas, e não respostas. Esta atitude filosófica deve ser claramente separada da mera opinião ou dos gostos pessoais. Não é filosófico dizer “eu acho que”, “eu gosto de”... A filosofia estabeleceu-se como saber lógico, rigoroso, que quebra o senso comum, ou seja, que não se contenta com aquilo que nos é contado sem explicações, sem sabermos os porquês.
ESPECIFICIDADE DO CONHECIMENTO FILOSÓFICO
Filosofia é o esforço racional para tentar compreender o Universo. Assim, podemos perceber a diferença entre religião e filosofia.
A religião tem por base a fé, pela qual se aceitam verdades não demonstráveis e que tantos consideram até mesmo irracionais. Claro que isso não significa que, sob todos os pontos de vista, as verdades de fé não sejam aceitáveis. Até mesmo alguns filósofos, como São Tomás de Aquino, na Idade Média, tentou mostrar que fé e razão não eram incompatíveis. Já a filosofia, como lemos antes, preocupa-se com o conhecimento racional, com a origem (raiz), a ética, a política, a estética, as quais estudaremos mais tarde.
Assim, a filosofia é reflexão, é crítica e é análise. Isso não quer dizer que ciência e filosofia são a mesma coisa. As ciências estudam “o quê” e o “como” dos fenômenos, enquanto a filosofia estuda o “porquê” e o “que é”.
OS GREGOS INVENTAM A FILOSOFIA
A filosofia tem uma história de mais de dois mil e quinhentos anos. Nascida na Grécia Antiga, ali se consolidou, tornando-se uma das principais marcas da civilização ocidental. Os gregos, desde os primórdios (por volta de 1500 a. C., com a civilização micênica), se concentraram nas costas do Mar Mediterrâneo, em pequenas e distintas nações, constituindo posteriormente cidades independentes e rivais entre si (as cidades-estado ou pólis). Cada cidade com sua cultura, seus hábitos, sua política. Mesmo assim, foi criada uma comunidade de língua e de religião, o que fez com que se constituíssem em um povo.
Antes do advento (surgimento) da filosofia, os gregos explicavam o mundo ao seu redor através dos mitos. Havia os mitos sobre a origem do mundo, do homem, sobre os fenômenos da natureza, entre muitos outros. Dentro da mitologia grega estavam os deuses, a quem eram atribuídas muitas coisas que aconteciam ou existiam no Universo. Por exemplo, Atenas era a deusa da sabedoria; Afrodite, a deusa da beleza; Poseidon, o deus dos mares e terremotos; Apolo, deus do sol e da verdade...
Com o passar do tempo, entre os séculos VI e V a. C., cresceu a importância das cidades-estado Esparta e Atenas. Esta última desenvolveu muito o comércio e expandiu-se em direção a outras cidades-estado, adquirindo muito poder. Atenas criou a democracia direta, sistema político em que todos os cidadãos podiam participar, e foi palco para o surgimento das artes, das tragédias, das comédias e, o que mais nos interessa, da filosofia.
Podemos afirmar então que a filosofia surgiu na Grécia no momento em que as cidades começaram a crescer, a vida em sociedade se intensificou, o comércio se desenvolveu, surgiu a moeda como forma de troca, apareceu a escrita alfabética, o calendário, e a política floresceu.
Os homens passaram a necessitar de respostas para organizar aquela nova vida social e os mitos não foram mais capazes de explicar o mundo. Além disso, os filósofos antigos passaram a acreditar que era impossível solucionar alguma questão a partir dos sentidos (tato, olfato, visão, audição, paladar), pois cada um tem sensações diferentes, nem através dos sentimentos (amor, apego, ira), pois eles são instáveis, e muito menos pelas opiniões (chamadas também de doxas), já que podem mudar a qualquer momento. Os gregos, por isso, desejaram criar uma forma de conhecimento que fosse válida para todos, em qualquer tempo e em qualquer sociedade, ou seja, um conhecimento universal, neutro, objetivo e imutável, baseado em algo que pertence a qualquer ser humano: a razão. Assim, a visão racional começou a predominar e servir de base para perguntas como: qual a origem do mundo? O que são os fenômenos da natureza? O que é o homem?
Os primeiros nomes da filosofia são os de Tales de Mileto, Heráclito, Anaximandro, Anaxágoras, Xenófanes, Parmênides e Demócrito, a quem estudaremos posteriormente. Também podemos mencionar os três maiores representantes da filosofia grega: Sócrates, Platão e Aristóteles, dos quais falaremos adiante.
SÓCRATES, PLATÃO E ARISTÓTELES
Sócrates foi um filósofo ateniense nascido em 469 a.C. e morto aos setenta anos, em 399 a. C. Seu pensamento é muito importante para o nascimento da filosofia, influenciando-a até os dias de hoje. Ele nunca deixou nada escrito, motivo pelo qual só conhecemos suas idéias através dos textos de seu mais importante discípulo e seguidor: o filósofo Platão.
O grego Sócrates desenvolveu o método da “maiêutica”, que quer dizer o “parto de idéias”. Ele fazia os jovens atenienses duvidarem de tudo aquilo que pensavam que sabiam para, a partir de então, fazê-los criar uma nova idéia vinda de dentro deles próprios. Isso era a “maiêutica”. A célebre expressão “conhece-te a ti mesmo” significa, então, a busca de uma verdade na razão de cada um de nós, o que nos faz refletir sobre as informações que nos são passadas e não apenas aceitá-las como se fossem verdades. Assim, era na filosofia, no pensamento racional, que estava a busca pela verdade. Ou ainda mais: o filósofo era aquele que buscava racionalmente a verdade.
Outra frase famosa de Sócrates é a “só sei que nada sei”. Segundo ele, reconhecer nossa própria ignorância era o primeiro e mais importante passo para a busca do conhecimento. Somente se nos livrássemos dos dogmas (crenças fechadas, sem explicações) poderíamos nos questionar sobre o mundo e, assim, aprender sobre ele. Sócrates afirmava que as pessoas deviam chegar à essência de todas as coisas (o que faz delas o que são), e não apenas no conhecimento superficial sobre elas. Assim, ele se perguntava: qual é a essência da justiça? Qual é a essência da virtude? Qual é a essência do bem?
O grego nunca buscou para si riqueza material, pois considerava que o importante da vida era o auto-desenvolvimento e a busca pelas virtudes. Há uma suposta estória de que, certa vez, Sócrates passou horas, descalço, sobre a neve, “filosofando” sobre tal fenômeno da natureza.
Sócrates foi incompreendido em sua sociedade e acusado de “corromper” a juventude, que passou a questionar os mitos e as explicações mágicas do mundo para fazer uso da razão. O filósofo passou por um julgamento e foi condenado, o que o obrigou a beber cicuta (veneno) e provocou sua morte.
O filósofo Platão, por sua vez, compartilhava muitas ideias com seu mestre Sócrates. Porém, acreditava que o filósofo não era aquele que buscava a verdade, mas sim aquele que encontrava a verdade, também por meio da razão. Para Platão, a verdade não era subjetiva (não vinha de dentro dos homens), e sim objetiva, ou seja, estava fora dos seres humanos e simplesmente existia como tal na realidade. A tarefa do homem era conhecer racionalmente essa realidade para alcançar, enfim, a verdade.
Tanto Platão quanto Sócrates pensavam que só os filósofos poderiam fazer o bem e, portanto, apenas eles seriam indicados para se encarregar da política. Platão afirmava que a tarefa dos políticos era colocar em prática a verdade alcançada com a sabedoria. O “mito da caverna”, escrito por ele, é importante para ilustrar essa ideia. O homem que saiu da caverna seria aquele que encontrou a verdade e precisou colocá-la em prática.
Platão desenvolveu ainda a ideia da existência de um mundo ideal, racional, que transcendia (ia além) inteiramente o mundo empírico (que experimentamos) e material em que vivemos. As idéias não seriam formas abstratas (sem existência fora da mente) do pensamento, mas sim realidades a serem conhecidas, objetivas, das quais tiraríamos cópias imperfeitas para criar nosso mundo material. Por exemplo: uma árvore que vemos em nossa frente, tocamos, cheiramos, sentimos, seria uma cópia imperfeita de uma árvore existente no mundo das ideias. A árvore ideal será sempre uma árvore, enquanto a árvore que vemos pode ser de vários tamanhos, formas, enfim, totalmente mutável. Desse modo, haveria dois mundos: um deles eterno e imutável, o mundo inteligível ideal e o mundo material que percebemos através dos nossos sentidos, o mundo sensível.
Falaremos, por último, do mais aplicado aluno de Platão, considerado por ele o maior leitor da Grécia: o grego Aristóteles. Este seguiu Platão por mais de vinte anos e, quando morreu seu mestre, fundou o liceu, uma espécie de escola ao ar livre, onde criou seu próprio pensamento filosófico.
Aristóteles discordava de Platão quanto à existência de dois mundos, um sensível e outro inteligível. Para o jovem discípulo, existia apenas um mundo, o sensível, este em que vivemos, apreensível pelos nossos sentidos, pela nossa experiência. A tarefa do filósofo era a de conhecer a essência imutável das coisas, através da razão, a partir dos sentidos. Aristóteles propunha uma observação incessante da natureza e a adoção de um rigoroso método que permitisse ao homem conhecer o mundo.
Ele foi o fundador da lógica, tão importante em nosso mundo contemporâneo e base de várias ciências, entre elas a física e a matemática. Outro assunto de que Aristóteles muito se ocupou foi a política. Para o pensador, “o homem é um animal político”, o que significa que a natureza dos homens faz com que se relacionem de forma a alcançar um bem no espaço da cidade, da polis (de onde deriva o nome político). Aristóteles morreu em 322 a.C.
A coruja, Ave de Minerva, é o símbolo da Filosofia. O filósofo Hegel escreveu que, assim como a coruja levanta vôo ao anoitecer, também a Filosofia e os grandes filósofos surgem em momentos em que a sociedade humana começa a anoitecer, a entrar em crise...
No seu sentido mais comum, o substantivo filosofia ou o verbo filosofar tem a ver com pensamento ou com o ato de pensar. Filosofar é pensar sobre o que nos acontece, sobre o sentido do que nos acontece ou sobre o significado da vida humana. Alguns dizem que se tem uma “filosofia de vida”. Mas este significado do termo certamente é muito amplo e vago. Há um sentido menos comum, em que filosofar significa saber viver com sabedoria, de acordo com uma doutrina, com uma Filosofia. Assim há, por exemplo, sabedorias diferentes daquelas que conhecemos no mundo ocidental, como as dos sábios orientais Confúcio e Lao Tsé (China), Buda (Índia) e Zaratustra (Pérsia), mas as suas doutrinas ainda estão vinculadas à religião, e não caracterizadas pelo uso da razão, pela racionalidade.
Existe, porém, um sentido mais específico e preciso de filosofar: procurar e/ou encontrar a verdade por meio de uma atividade racional. E a gente encontra a verdade porque precisa e deseja sabê-la. E a verdade é necessária para viver. Mas nem todas as perguntas que fazemos são perguntas filosóficas, como nem todas as respostas são respostas filosóficas. Não é “filosófico” saber: “que dia é hoje?”, mas é filosófico perguntar: “o que é o tempo?” O que é a verdade? O que é a mentira? O que é a liberdade? O que é a razão? São todas perguntas filosóficas. E sabemos que nem todos estão acostumados a fazê-las e tampouco consideram que sejam perguntas importantes.
A ATITUDE FILOSÓFICA
Podemos dizer que filosofar é ter uma “atitude filosófica”. Mesmo que digamos que “de filósofo e louco todo mundo tem um pouco”, de fato são poucos os que têm esta atitude, exigindo-se para isso o conhecimento dos textos da História da Filosofia e, principalmente, a criação do hábito de pensar de maneira rigorosa e crítica.
Falamos, portanto, da Filosofia que quebra com o nosso saber prático do dia a dia, e que nem sempre nos agrada, pois à primeira vista parece ser perda de tempo ou incômodo exagerado com as coisas, deixando-nos, quem sabe, angustiados demais, para além do conveniente.
O filósofo pode parecer alguém desligado da realidade, vivendo nas nuvens, em coisas abstratas, distraído, perdido ou aparentemente alheio aos problemas concretos da vida. Como exemplo desta visão preconceituosa da filosofia, temos a história do antigo sábio grego, chamado Tales, que, ao olhar para o céu a fim de entender os movimentos das estrelas, acabou caindo num poço. Ou com um ditado popular italiano bastante conhecido: “a Filosofia é a ciência com a qual ou sem a qual tudo continua tal e qual!”.
É claro que tudo isso não é verdade. O filósofo, ao contrário de ser uma pessoa distante do mundo, preocupa-se a fundo com suas questões e não se contenta com as coisas óbvias. Ele é inimigo mortal de qualquer fanatismo, de qualquer dogmatismo (crença não explicada). Todo filósofo é um porta-voz consciente de um povo.
Filósofo não inventa a realidade, mas interpreta a realidade em que vive. Assim, podemos afirmar que toda filosofia é e deve ser radical, pois não se contenta em ficar na superfície das coisas, mas procura ir às raízes (por isso, radical), busca desvendar os porquês das coisas.
O filósofo faz perguntas do tipo: o que é a realidade? Como a realidade é? Por que a realidade é assim? Ele procura a essência (aquilo que torna uma coisa aquilo que ela é), o significado e a origem do que quer conhecer.
O filósofo reflete. Falar de reflexão lembra o espelho no qual a gente se reflete. Pois bem: filosofar é refletir. É um movimento de volta sobre si mesmo. Refletir é pensar o próprio pensamento. É esta capacidade humana que nos distingue dos seres animais.
De toda forma, quem prefere uma vida tranquila, uma vida mais grudada ao cotidiano, ao terra-a-terra, fica longe da Filosofia. E quem quer alcançar maior profundidade, quem gosta de chegar às raízes, ser mais radical, vai precisar dela, mesmo que isso não lhe venha a trazer certezas ou tranquilidade.
O filósofo é quem assume correr o risco de viver mais inseguro, ter cada vez mais perguntas, e não respostas. Esta atitude filosófica deve ser claramente separada da mera opinião ou dos gostos pessoais. Não é filosófico dizer “eu acho que”, “eu gosto de”... A filosofia estabeleceu-se como saber lógico, rigoroso, que quebra o senso comum, ou seja, que não se contenta com aquilo que nos é contado sem explicações, sem sabermos os porquês.
ESPECIFICIDADE DO CONHECIMENTO FILOSÓFICO
Filosofia é o esforço racional para tentar compreender o Universo. Assim, podemos perceber a diferença entre religião e filosofia.
A religião tem por base a fé, pela qual se aceitam verdades não demonstráveis e que tantos consideram até mesmo irracionais. Claro que isso não significa que, sob todos os pontos de vista, as verdades de fé não sejam aceitáveis. Até mesmo alguns filósofos, como São Tomás de Aquino, na Idade Média, tentou mostrar que fé e razão não eram incompatíveis. Já a filosofia, como lemos antes, preocupa-se com o conhecimento racional, com a origem (raiz), a ética, a política, a estética, as quais estudaremos mais tarde.
Assim, a filosofia é reflexão, é crítica e é análise. Isso não quer dizer que ciência e filosofia são a mesma coisa. As ciências estudam “o quê” e o “como” dos fenômenos, enquanto a filosofia estuda o “porquê” e o “que é”.
OS GREGOS INVENTAM A FILOSOFIA
A filosofia tem uma história de mais de dois mil e quinhentos anos. Nascida na Grécia Antiga, ali se consolidou, tornando-se uma das principais marcas da civilização ocidental. Os gregos, desde os primórdios (por volta de 1500 a. C., com a civilização micênica), se concentraram nas costas do Mar Mediterrâneo, em pequenas e distintas nações, constituindo posteriormente cidades independentes e rivais entre si (as cidades-estado ou pólis). Cada cidade com sua cultura, seus hábitos, sua política. Mesmo assim, foi criada uma comunidade de língua e de religião, o que fez com que se constituíssem em um povo.
Antes do advento (surgimento) da filosofia, os gregos explicavam o mundo ao seu redor através dos mitos. Havia os mitos sobre a origem do mundo, do homem, sobre os fenômenos da natureza, entre muitos outros. Dentro da mitologia grega estavam os deuses, a quem eram atribuídas muitas coisas que aconteciam ou existiam no Universo. Por exemplo, Atenas era a deusa da sabedoria; Afrodite, a deusa da beleza; Poseidon, o deus dos mares e terremotos; Apolo, deus do sol e da verdade...
Com o passar do tempo, entre os séculos VI e V a. C., cresceu a importância das cidades-estado Esparta e Atenas. Esta última desenvolveu muito o comércio e expandiu-se em direção a outras cidades-estado, adquirindo muito poder. Atenas criou a democracia direta, sistema político em que todos os cidadãos podiam participar, e foi palco para o surgimento das artes, das tragédias, das comédias e, o que mais nos interessa, da filosofia.
Podemos afirmar então que a filosofia surgiu na Grécia no momento em que as cidades começaram a crescer, a vida em sociedade se intensificou, o comércio se desenvolveu, surgiu a moeda como forma de troca, apareceu a escrita alfabética, o calendário, e a política floresceu.
Os homens passaram a necessitar de respostas para organizar aquela nova vida social e os mitos não foram mais capazes de explicar o mundo. Além disso, os filósofos antigos passaram a acreditar que era impossível solucionar alguma questão a partir dos sentidos (tato, olfato, visão, audição, paladar), pois cada um tem sensações diferentes, nem através dos sentimentos (amor, apego, ira), pois eles são instáveis, e muito menos pelas opiniões (chamadas também de doxas), já que podem mudar a qualquer momento. Os gregos, por isso, desejaram criar uma forma de conhecimento que fosse válida para todos, em qualquer tempo e em qualquer sociedade, ou seja, um conhecimento universal, neutro, objetivo e imutável, baseado em algo que pertence a qualquer ser humano: a razão. Assim, a visão racional começou a predominar e servir de base para perguntas como: qual a origem do mundo? O que são os fenômenos da natureza? O que é o homem?
Os primeiros nomes da filosofia são os de Tales de Mileto, Heráclito, Anaximandro, Anaxágoras, Xenófanes, Parmênides e Demócrito, a quem estudaremos posteriormente. Também podemos mencionar os três maiores representantes da filosofia grega: Sócrates, Platão e Aristóteles, dos quais falaremos adiante.
SÓCRATES, PLATÃO E ARISTÓTELES
Sócrates foi um filósofo ateniense nascido em 469 a.C. e morto aos setenta anos, em 399 a. C. Seu pensamento é muito importante para o nascimento da filosofia, influenciando-a até os dias de hoje. Ele nunca deixou nada escrito, motivo pelo qual só conhecemos suas idéias através dos textos de seu mais importante discípulo e seguidor: o filósofo Platão.
O grego Sócrates desenvolveu o método da “maiêutica”, que quer dizer o “parto de idéias”. Ele fazia os jovens atenienses duvidarem de tudo aquilo que pensavam que sabiam para, a partir de então, fazê-los criar uma nova idéia vinda de dentro deles próprios. Isso era a “maiêutica”. A célebre expressão “conhece-te a ti mesmo” significa, então, a busca de uma verdade na razão de cada um de nós, o que nos faz refletir sobre as informações que nos são passadas e não apenas aceitá-las como se fossem verdades. Assim, era na filosofia, no pensamento racional, que estava a busca pela verdade. Ou ainda mais: o filósofo era aquele que buscava racionalmente a verdade.
Outra frase famosa de Sócrates é a “só sei que nada sei”. Segundo ele, reconhecer nossa própria ignorância era o primeiro e mais importante passo para a busca do conhecimento. Somente se nos livrássemos dos dogmas (crenças fechadas, sem explicações) poderíamos nos questionar sobre o mundo e, assim, aprender sobre ele. Sócrates afirmava que as pessoas deviam chegar à essência de todas as coisas (o que faz delas o que são), e não apenas no conhecimento superficial sobre elas. Assim, ele se perguntava: qual é a essência da justiça? Qual é a essência da virtude? Qual é a essência do bem?
O grego nunca buscou para si riqueza material, pois considerava que o importante da vida era o auto-desenvolvimento e a busca pelas virtudes. Há uma suposta estória de que, certa vez, Sócrates passou horas, descalço, sobre a neve, “filosofando” sobre tal fenômeno da natureza.
Sócrates foi incompreendido em sua sociedade e acusado de “corromper” a juventude, que passou a questionar os mitos e as explicações mágicas do mundo para fazer uso da razão. O filósofo passou por um julgamento e foi condenado, o que o obrigou a beber cicuta (veneno) e provocou sua morte.
O filósofo Platão, por sua vez, compartilhava muitas ideias com seu mestre Sócrates. Porém, acreditava que o filósofo não era aquele que buscava a verdade, mas sim aquele que encontrava a verdade, também por meio da razão. Para Platão, a verdade não era subjetiva (não vinha de dentro dos homens), e sim objetiva, ou seja, estava fora dos seres humanos e simplesmente existia como tal na realidade. A tarefa do homem era conhecer racionalmente essa realidade para alcançar, enfim, a verdade.
Tanto Platão quanto Sócrates pensavam que só os filósofos poderiam fazer o bem e, portanto, apenas eles seriam indicados para se encarregar da política. Platão afirmava que a tarefa dos políticos era colocar em prática a verdade alcançada com a sabedoria. O “mito da caverna”, escrito por ele, é importante para ilustrar essa ideia. O homem que saiu da caverna seria aquele que encontrou a verdade e precisou colocá-la em prática.
Platão desenvolveu ainda a ideia da existência de um mundo ideal, racional, que transcendia (ia além) inteiramente o mundo empírico (que experimentamos) e material em que vivemos. As idéias não seriam formas abstratas (sem existência fora da mente) do pensamento, mas sim realidades a serem conhecidas, objetivas, das quais tiraríamos cópias imperfeitas para criar nosso mundo material. Por exemplo: uma árvore que vemos em nossa frente, tocamos, cheiramos, sentimos, seria uma cópia imperfeita de uma árvore existente no mundo das ideias. A árvore ideal será sempre uma árvore, enquanto a árvore que vemos pode ser de vários tamanhos, formas, enfim, totalmente mutável. Desse modo, haveria dois mundos: um deles eterno e imutável, o mundo inteligível ideal e o mundo material que percebemos através dos nossos sentidos, o mundo sensível.
Falaremos, por último, do mais aplicado aluno de Platão, considerado por ele o maior leitor da Grécia: o grego Aristóteles. Este seguiu Platão por mais de vinte anos e, quando morreu seu mestre, fundou o liceu, uma espécie de escola ao ar livre, onde criou seu próprio pensamento filosófico.
Aristóteles discordava de Platão quanto à existência de dois mundos, um sensível e outro inteligível. Para o jovem discípulo, existia apenas um mundo, o sensível, este em que vivemos, apreensível pelos nossos sentidos, pela nossa experiência. A tarefa do filósofo era a de conhecer a essência imutável das coisas, através da razão, a partir dos sentidos. Aristóteles propunha uma observação incessante da natureza e a adoção de um rigoroso método que permitisse ao homem conhecer o mundo.
Ele foi o fundador da lógica, tão importante em nosso mundo contemporâneo e base de várias ciências, entre elas a física e a matemática. Outro assunto de que Aristóteles muito se ocupou foi a política. Para o pensador, “o homem é um animal político”, o que significa que a natureza dos homens faz com que se relacionem de forma a alcançar um bem no espaço da cidade, da polis (de onde deriva o nome político). Aristóteles morreu em 322 a.C.